As crianças precisam organizar as diferenças no mundo e uma delas é a diferença de sexos. A partir da curiosidade com seus corpos e da experimentação, questões podem surgir e os pais, mães e familiares devem ouvir a criança, buscando compreender e reconhecer seu universo e não antecipando ou avaliando a situação a partir de noções apressadas ou que estejam carregadas das perspectivas e dos significados adultos para estas questões.
Na roda de conversa sobre sexualidade infantil realizada na Catavento na última semana, muitas dimensões da sexualidade infantil emergiram e foram tema de uma conversa leve e fluida. A abertura para conversar, a disposição para a escuta da criança se mostram necessárias quando o assunto é sexualidade. E a escola é parceira das famílias nesta construção. “Foi um momento especial em que os pais e mães puderam se colocar, tirar dúvidas e falar abertamente de um assunto que é tão natural, mas que gera muita angústia e desconforto para alguns quando precisam lidar com ele”, disse a diretora Adelia Morelli.
Diferenças sem competição
A psicóloga Lígia Polistchuck, mãe da Manu, do GIV, que facilitou o encontro, conta que algumas questões emergiram, entre elas, as diferenças entre sexos e suas implicações, a origem dos bebês, a masturbação e como lidar com consentimento e abusos. “As crianças precisam organizar as diferenças no mundo e uma delas é a diferença de sexos. O que não significa que essa diferença deve ser ensinada ou compreendida de maneira a dizer que ser um ou outro é melhor ou pior, ou replicada de maneira machista, como quando ouvimos frases como “segura suas cabras que meu bode está solto”. Meninos e meninas podem ser diferentes sem que isso seja uma competição”, afirma Ligia.
Este foi o terceiro encontro mediado por Ligia na Escola. E ela conta que uma das questões sobre as quais sempre gosta de conversar é a da confusão de línguas. “Diversas vezes as crianças fazem afirmações ou perguntas usando palavras que conhecemos, mas, esquecemos que nem sempre o significado que elas dão a essas palavras é o mesmo que damos. De onde vem os bebês, muitas vezes quer dizer “de onde eu vim” e não “como é que funciona o sexo genital, afinal?”, explica.
Ligia afirma que é sempre importante poder perguntar o que a criança quer dizer com determinadas palavras, antes que nos apressarmos a entender pelo nosso próprio ponto de vista adulto o que ela quis dizer.
Corpo, público e privado
“As crianças experimentam o próprio corpo e descobrem maneiras prazerosas de fazê-lo. O sexo adulto nada tem a ver com isso. Mas foi bem interessante conversar sobre a questão do público e do privado, já que uma das questões importantes frente ao medo de que os filhos se toquem em qualquer lugar, passa pela construção do que é público e do que é privado. Tanto o corpo, tanto o que se faz com esse corpo”, relata Ligia. “Há diferenças entre cenas sexuais e experimentações entre crianças de uma mesma idade, mas, ainda, a questão do público e o privado devem ser pontuadas, pois o ambiente da escola, por exemplo, é um ambiente público, no qual se marca uma inadequação frente a essas situações”, explica a psicóloga. Ela afirma que esta marca deve sim ser falada para as crianças.
Consentimento
Ligia informa que é importante contar para as crianças que o corpo é delas e que ninguém pode tocá-lo, a menos que seja para ajudá-la a se limpar, por exemplo. “É fundamental dizer, ainda, que ela não tem direito de tocar no corpo de ninguém sem autorização, da mesma maneira”, diz.
O medo de abusos ronda a fantasia de mães e pais, e, quanto a isso, falar abertamente é sempre muito melhor do que não falar. “É preciso dizer que nenhum adulto pode convidar a criança a tocar no corpo dele ou vice versa, bem como colocar a criança em situações nas quais ela se sinta desconfortável ou culpada. E que ela deve sempre contar com os adultos de sua confiança, mesmo que esteja com medo ou culpada”, explica Ligia.
A psicóloga recomendou um vídeo chamado “Defenda-se” como instrumento de diálogo com as crianças. “Mostrar o vídeo pode ajudar bastante. As crianças precisam identificar algo desse tipo para poder falar sobre isso”, finaliza Ligia.